TRIBUNAL SUPREMO REABRE O CASO DO BALEAMENT0 DE AGOSTINHO VUMA
Quatro anos depois do baleament0 do presidente da Confederação das Associações Económicas
de Moçambique (CTA) e deputado da Assembleia da República (AR), Agostinho Vuma, o Tribunal Supremo (TS) reacendeu o caso, ao anular o Acórdão do Tribunal Superior do Recurso (TSR) de Maputo, que despronunciava o arguido Salimo Momad Muidine, acusado do crime de autoria material e uso de armas proibidas, por insuficiência de provas.
Com esta decisão, o TS dá luz verde à 10ª Secção do Tribunal Judicial da Cidade de Maputo (TJCM) para avançar com o julgamento do agente do Serviço Nacional de Investigação Criminal (SERNIC), acusado de autoria material de homicídi0 frustrado contra a pessoa de Agostinho Vuma.
O recurso contra a decisão do TSR foi apresentado pelo Ministério Público (MP), por entender que no processo havia elementos bastantes para acusar o indiciado.
Tudo começa a 11 de Julho de 2020, quando, por volta das 15 horas e 11 minutos, um agente do SERNIC, identificado pelo nome de Salimo Momad
Muidine, na companhia do seu comparsa não identificado nos autos, desceram na esquina entre
as avenidas Josina Machel e Karl Marx, cidade de Maputo, numa viatura de marca Toyota Ractis
de cor cinzenta, cuja matrícula não foi identificada, e ambos se dirigiram ao Prédio Tavares, localizado na avenida Josina Machel, nº 140.
De acordo com a Acusação do MP e chancelado pela juíza da 10ª Secção do TJCM, em sede de despacho de pronúncia, no local, os dois subiram as escadas com a intenção de se dirigirem ao 1º andar onde funciona o escritório da ví!tima.
Após cruzarem com Agostinho Vuma, o comparsa de Salimo simulou que continuava a subir
e repentinamente golpeou a v!tima por trás apertando-a com o braço no pescoço, impedindo-a de efectuar qualquer movimento.
Nesse instante, segundo a acusação, sobressaiu o réu Salimo Muidine, na frente da vítima, e acto contínuo, retirou do bolso superior do casaco que trazia uma arma de fogo do tipo p!stola, tendo na sequência se descuidado e deixado cair a máscara de protecção contra a Covid-19,
facto que permitiu à v!tima visualizar o seu rosto.
De acordo com o MP, Agostinho Vuma conhecia o réu através das fotografias do mesmo exibidas pela cidadã Yara Simões Cossa, que lhe indicou como pessoa que vinha lhe seguindo por ordens do cidadão identificado nos autos por Silvestre Bila.
Dando prosseguimento à sua acção criminal e sem proferir qualquer palavra, Salimo Muidine apontou a arm4 na direcção do deputado e disparou dois tiros que atingiram a região temporo facial direita causando feriment0s gr4ves.
Em seguida, o réu e o comparsa abandonaram o local a pé, seguindo pela avenida Josina Machel em direcção à avenida Karl Marx, ainda empunhando arma de fogo, tal como foi apurado nas imagens captadas pelas câmaras montadas em redor do local do cr!me.
Consta nos autos que, dois meses antes, isto é, em Maio de 2020, Agostinho Vuma surpreendeu
Salimo Muidine seguindo-o a bordo da viatura do cidadão Silvestre Bila.
Apercebendo-se do movimento estranho da viatura em causa, a v!tima imobilizou a sua viatura nos Paços do Conselho Municipal de Maputo e viu os perseguidores. Segundo os autos de acusaçã0, tratava-se de Salimo Muidine e Silvestre Bila. No entanto, Silvestre Bila não é parte do processo.
Perante os factos, a juíza da 10ª Secção do TJCM entendeu que o agente do SERNIC agiu deliberadamente, livre e consciente, pelo que, há matéria bastante para levar o arguido ao julga-
mento pela autoria material em concurso real de um crime de hom!cídio frustrado e de uso de arm4s proibidas, todos previstos e punidos nos termos do Código Penal.
Na mesma circunstância, o TJCM manteve a medida de coação máxima de prisão preventiva promovida pelo MP, com o fundamento do perigo de perturbação do processo, justificado pelo facto de o réu ser agente do Serviço Nacional de Investigação Criminal.
Na altura dos factos, Salimo Muidine estava afecto à Brigada de Investigação Operativa do SERNIC na cidade de Maputo. Ademais, o TJCM entendeu que o réu e o comparsa agiram na sequência de um plano previamente concertado que visava retirar a v!da do presidente da CTA, o que não aconteceu devido ao pronto atendimento médico de que beneficiou.
Na mesma decisão, o TJCM deliberou que Salimo Muidine estava proibid0 de manter qualquer contacto com o cidadão Silvestre Bila até ao desfecho do processo. O comparsa de Muidine ainda não foi localizado até ao momento.
Em sede do processo consta que a senhora Yara Cossa alertara Agostinho Vuma para que se acautelasse, visto que estava a ser seguido por um indivíduo a mando de Silvestre Bila, com
intenções desconhecidas.
Yara Cossa testemunhou, em sede do processo, que reconhecera o indivíduo como quem já estivera algumas vezes com Silvestre Bila na sua viatura e a mesma pessoa que também seguira a ela. Estes testemunhos foram igualmente confirmados por outra testemunha, irmã de Yara Cossa.
A consubstanciar estes depoimentos, o despacho de pronúncia contra Salimo Muidine, exarado pelo TJCM proibiu o arguido de manter qualquer contacto com o senhor Silvestre Bila, durante a instrução do processo autónomo contra o autor moral do cr!me, sob o fundamento de não perturbar o curso do processo.
Ademais, o próprio Acórdão do TSR, em sede do Processo 13/2021, refere-se, na sua página
20, a Silvestre Bila como o suposto mandante do crime, o que, de per si, salvo prova em contrá-
rio e produzida em sede de julgamento, pode ser assumido como uma probabilidade. O acórdão de despronúncia não consensual Inconformado com a deliberação da juíza da 10ª Secção do TJCM,
de levá-lo ao julgamento, o réu, através dos seus advogados, recorreu da decisão junto ao TSR
de Maputo.
Depois de avaliar os argumentos das partes, sem consensos, o colectivo de juízes da 3ª Secção
do TSR de Maputo entendeu, através de Acórdão de 24 de Setembro de 2021, dar provimento o recurso interposto pelo réu e decidiu despronunciá-lo alegan do insuficiência de provas.
No mesmo despacho, os juízes Desembargadores do TSR frisaram que os autos não apresentam
indícios suficientes e adequados para a aplicação da medida mais grav0sa ao arguido e nem sequer
para a submissão do mesmo ao julgamento, ou seja, não existiam, nos autos, elementos probatórios que conduzissem a um juízo de probabilidade para o efeito. Na mesma ocasião, o TSR de Maputo ordenou a soltura do agente atirador que estava em prisão preventiva desde Julho de 2021.
Contudo, a decisão não foi consensual, visto que um dos membros do jurado entendia que a decisão do TJCM devia prevalecer. Foi o juiz Desembargador Dimas Marrôa que votou contra a despronúncia de Salimo Muidine, por entender que da investigação foram recolhidos indícios suficientes que determinem que o arguido seja submisso a medidas de segurança grav0sas.
Segundo a declaração do voto vencido, apenso no Acórdão do TSR de Maputo, Dimas Marrôa diz que das evidências careadas nos autos, tendo a testemunha Yara Francis Simões Cossa, assim como a v!tima Agostinho Zacarias Vuma, revelaram que o arguido, ora despronunciado, já vinha seguindo seus itinerários, supostamente a mando de alguém identificado nos autos [Silvestre Bila] e, continua, atendo-se ao que viria suceder, tais declarações deveriam ser objecto de uma profunda sindicância processual em vista a sua confirmação ou não.
Estas declarações foram refutadas pelos visados,
contudo, no entender de Marrôa, a sede própria para o confronto, visando buscar os esclarecimentos das evidentes zonas de penumbras, seria sem sobra de dúvidas a audiência de discussão e julgamento. Marrôa finalizou a sua declaração sublinhando que entende que os indícios colhidos pelo MP se mostram bastantes para submissão do arguido a julgamento.
TS reprova TSR e ordena o julgamento de Salimo
Muidine. Insatisfeitos com o veredicto da parte do colectivo de juízes da 3ª Secção, o MP e o fendido recorreram ao TS sob alegação de que os requisitos do despacho de pronúncia encontram-se totalmente preenchidos, nos termos da lei, por isso, não há lugar a despronúncia, visto que, ainda nos termos da lei, não há vícios ou nulidades.
O MP e o ofendido acrescentam que a prova em processo criminal deverá ser valorada na sua
globalidade, sendo que a única prova inabalável é documental. Diz também que a diligência de
reconhecimento levada a cabo nos presentes autos está em conformidade com a lei e, embora se reconheça o valor probatório do relatório pericial constante nos autos, o mesmo está sujeito a uma margem de erro superior a um relatório cujo exame incide no ADN, pelo que entende que o espaço privilegiado para uma demonstração é a audiência e julgamento. (SAVANA)
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